quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Original teoria de Kaufman no final berlinense

Larry Kaufman é um grande mestre estadounidense -obteve o título ao vencer no campeonato mundial senior no ano 2008-, autor de diversas obras teóricas. Em uma delas, ele recomenda (para as pretas) a seguinte linha do final berlinense:

1.e4 e5 2.Cf3 Cc6 3.Bb5 Cf6 4.0–0 Cxe4 5.d4 Cd6 6.Bxc6 dxc6 7.dxe5 Cf5 8.Dxd8+ Rxd8 9.Cc3 Re8 10.h3 Be7


A ideia central nesta variante consiste em trocar um par de cavalos mediante ...Ch4, explicando que um objetivo posicional para o lado que conta com dois bispos é trocar seu cavalo remanente, pois desse jeito se elimina uma peça que o adversário pode utilizar para obter uma troca por um dos bispos.
No seu livro "The Berlin Wall", John Cox sinala: "eu nunca ouvi esse principio, porém parece ser uma manobra útil, já que desde um ponto de vista ela salva tempos: as pretas não precisam jogar Cf5-e7-g6, como não precisam jogar ...h6 antes de levar seu bispo à casa e6. De fato, tal como o ditado de Kaufman sugiere, a troca de cavalos tem o mérito de solidificar a posição do bispo em e6".

Uma recente partida com este tema:

Dvirnyy,D (2492) - Rusev,K (2518)
2nd Mantova Open A 2012 Mantova ITA (5), 05.01.2012

1.e4 e5 2.Cf3 Cc6 3.Bb5 Cf6 4.0–0 Cxe4 5.d4 Cd6 6.Bxc6 dxc6 7.dxe5 Cf5 8.Dxd8+ Rxd8 9.Cc3 Re8 10.h3 Be7 11.g4 Ch4 12.Cxh4 Bxh4 13.Rg2 h5 14.f3 Be6 15.Be3 a6 16.Tfd1 Td8 17.b3 Be7 18.Txd8+ Rxd8 19.Td1+ Re8 20.Ce4 hxg4 21.hxg4 f5 22.exf6 gxf6 23.Bd4 Th6 24.Te1 ½–½

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Fazendo fácil o difícil

No seguinte final as brancas, conduzidas pela ex campeã mundial Maia Chiburdanidze, realizam uma tarefa modelo na condução de um final de torres com destino de livro, explorando os elementos positivos da sua posição para se impor em um difícil final. Certo, ela teve ajuda da adversária na posição crítica -as pretas podiam ter exercido uma forte resistência se em vez de seu lance 41...Rh7 escolhiam 41...g6!? porém isso não invalida o bom exercício técnico realizado pelas brancas na procura da concretização da sua ligeira vantagem do começo

Chiburdanidze,Maia (2500) - Cmilyte,Viktorija (2503)
ACP Women Cup 2012 Tbilisi GEO (2.4), 18.02.2012



[Comentários do MI Luis Rodi]

1.d4 Cf6 2.Cf3 e6 3.c4 c5 4.e3 a6 5.Cc3 d5 6.a3 Cc6 7.b3 Bd6 8.Bd3 0–0 9.0–0 De7 10.Bb2 b6 11.Ca4 Tb8 12.Dc2 h6 13.dxc5 bxc5 14.cxd5 exd5 15.Bxf6 Dxf6 16.Cxc5 Ce5 17.Cxe5 Dxe5 18.g3 Bxc5 19.Dxc5 Txb3 20.Bc4 Tc3 21.Dxd5 Df6 22.Be2 Td8 23.Da5 Tc2 24.Tad1 Txd1 25.Txd1 Txe2 26.Dd8+ Dxd8 27.Txd8+ Rh7 28.Txc8 Ta2 29.Tc3 h5


As brancas têm peão a mais, porém a ativa colocação da torre preta augura uma firme resistência das pretas. No entanto, a ex campeã mundial faz fácil o difícil e joga de forma modélica (sendo uma partida jogada em ritmo rápido, dobremente meritório). Vamos explicar passo a passo os acontecimentos:

30.Tc5!

Com esta ideia, as brancas obtém uma importante diferença de peões na ala do rei. As pretas não têm como impedir esse desequilibrio: se o peão h é defendido, então Ta5 ganha o peão a6 com posição teoricamente ganha

30...Txa3 31.Txh5+ Rg6 32.Tc5

As brancas obtiveram um 4:2 na ala do rei. A sua maioria vai avançar apoiada pelo rei. Na procura de contrajogo, as pretas fazem uso do seu elemento positivo, o peão livre -no entanto, ele pode ser controlado de forma simples-

32...a5 33.Rg2 Ta2 34.h4


A primeira jogadora começa o avanço. Dois cenários são possíveis nesta estrategia: a) se produz uma simplificação que deixa dois peões livres na ala do rei; b) os peões e o mesmo rei são empregados para criar temas de ataque contra o rei preto

34...f6 35.g4 a4 36.Ta5!

A torre se posiciona detrás do peão livre de forma imediata, como ensinam os livros clássicos de finais. Esta peça mantém vigilancia sobre o peão livre inimigo ao tempo que posicionada ativamente interviene nas funciões ofensivas brancas

36...Ta1 37.Rg3 Ta2 38.f3 a3 39.h5+ Rh6 40.Rf4±

O rei e os peões brancos avançam de forma harmónica

40...Ta1 41.Ta8


41...Rh7?

41...g6 era necessária 42.hxg6 Rxg6 43.Ta6 a2 44.Ta7 Rh6 45.Ta5 Rg6 46.Re4 Rg7 47.f4 Rg6! (47...Tg1 48.Txa2 Txg4 49.Rf5 Tg3 50.Ta7+ Rh6 51.e4+- com a ideia Ta6) 48.g5 fxg5 49.Txg5+ Rf6 50.Ta5 é um exemplo do cenário a) onde as brancas obtiveram dois peões livres, porém aqui podem não ganhar! Por exemplo 50...Rg7 51.f5 Rf6 52.Ta6+ Rf7 53.Re5 Te1 54.Ta7+ Rg8 55.Txa2 Txe3+ 56.Rf6 Tf3=

42.Rf5 Tf1 43.f4!+-

Obviamente as brancas conservam as suas cartas de vitória. Seria um erro a troca do peão f pelo livre das pretas, toda vez que após 43.Txa3 Txf3+ as chances de vitória brancas ficam reduzidas a mínima expressão

43...Ta1


44.h6!

A última fase da partida tem lugar agora. O ativo posicionamento das forças brancas permite que o cenário b) mencionado no comentário ao lance 34 seja uma realidade

44...gxh6 45.Ta7+ Rg8 46.Rg6 Rf8 47.Rxf6 Re8

47...Rg8 48.Rg6 Rf8 49.f5 Tg1 50.Ta8+ Re7 51.f6+ Re6 52.Ta6+ Rd7 53.f7+-

48.e4

Mediante ameaças de mate as brancas finalmente obtiveram uma versão favorável -pela ativação do seu rei- do cenário a) -isto é: dois peões livres-

48...a2


Se preparando para trocar o peão passado por algúm dos peões brancos, porém...

49.Rf5! Rd8 50.e5 Re8

50...Rc8 51.e6 Rb8 52.Ta4+- não é melhor

51.e6 Rd8

As pretas abandonaram sem esperar 52.e7+ Re8 53.Rf6 (com a ideia Ta8+) onde 53...Te1 54.Txa2 Txe7 55.Ta8+ e Ta7+ ganha 1–0


 

Xadrez e selos postais


O xadrez é um tema recurrente no disenho dos selos postais. Uma das últimas edições, muito bonita por certo, foi a realizada no território inglês de Gibraltar com motivo de se celebrar o famoso open. Os quatro selos emitidos mostram algumas instancias de jogos realizados nesse torneio.
As peças, que têm valores entre dois peniques e duas libras, foram disenhadas por Stephen Perera e tem um tamanho de 25,7 x 39,5 mm.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Fier lidera na França

O grande mestre Alexandr Fier lidera em forma isolada no open de Rochefort (França) com 4 em 4 após vencer Harutjunyan. Entre os que compartilham a segunda colocação, com meio ponto a menos, aparece o gm Mekhitarian. Já Barbosa leva 3 e Abdalla e Molina, 2,5 unidades. A prova acaba o próximo 2 de março e o site oficial é: http://www.echiquier-rochefortais.com/index.php

A volta de Karpov


Após um longo tempo retirado dos tabuleiros (excepção feita de diversas participações em provas rápidas) o ex campeão mundial Anatoly Karpov voltou participar de uma competência pensada, na Bundesliga alemã, representando a equipe de Hockenheim.
No passado 26 disputou a sua primeira partida, que acabou em empate após o lendário mestre não poder impor um final com peão a mais (bispos de cor diferente atrapalhavam...). Aqui o jogo:


Karpov,A (2617) - Kraemer,M (2492)
Hockenheim GER (11.1), 26.02.2012
1.Cf3 Cf6 2.c4 e6 3.Cc3 d5 4.d4 Be7 5.Bf4 0–0 6.e3 Cbd7 7.Be2 dxc4 8.Bxc4 a6 9.a4 c5 10.0–0 cxd4 11.Dxd4 Cb6 12.Bb3 Dxd4 13.Cxd4 Bd7 14.a5 Cbd5 15.Cxd5 Cxd5 16.Be5 Tac8 17.Tfd1 Tfd8 18.Bxd5 exd5 19.Ce2 f6 20.Bc3 Be6 21.h3 Rf7 22.Td2 g5 23.f3 Bc5 24.Rf2 Te8 25.Bd4 Bb4 26.Bc3 Bc5 27.Cd4 Bd7 28.Te1 h6 29.Cc2 Bf5 30.Cb4 Bxb4 31.Bxb4 Tc2 32.Txc2 Bxc2 33.Bc5 Bb3 34.Tc1 Tc8 35.Tc3 Bc4 36.Bd4 Tc6 37.b4 h5 38.g4 Rg6 39.Tc1 f5 40.Tg1 hxg4 41.hxg4 fxg4 42.Txg4 Rf5 43.Bb6 Tc8 44.Bd4 Tc6 45.Tg1 Th6 46.Rg3 Th7 47.Tc1 Re6 48.Ba7 Tf7 49.Tc2 Bd3 50.Td2 Bf5 51.Bb6 Th7 52.Tg2 Th3+ 53.Rf2 g4 54.fxg4 Be4 55.Tg1 Th2+ 56.Rg3 Th1 57.Txh1 Bxh1 58.Rf2 Be4 59.Re2 Rf6 60.Bd8+ Re5 61.Bc7+ Rf6 62.Bf4 Re6 63.Bh6 Bg6 64.Bg7 Rf7 65.Bh8 Be4 66.Be5 Re6 67.Bf4 Bg2 68.Rd3 Bf3 69.g5 Rf5 70.Rd4 Be4 71.Rc5 Rg6 72.Rb6 Rf5 73.Bg3 d4 74.exd4 Rxg5 75.Rc5 Rf6 76.Rd6 Rf7 77.d5 Bf3 78.Bh4 Bg2 ½–½

O nexo entre avaliação e cálculo

Dentre os lendários encontros entre as duas K, o celebrado nas cidades de Nova York e Lyon no ano 1990 foi um dos mais interessantes desde o ponto de vista criativo, com ambos os grandes mestres lutando pelo ponto sem importar cor. O seguinte exemplo -tomado da quarta partida daquele match- se enmarca no tema enunciado no título desta postagem

Kasparov,Garry (2800) - Karpov,Anatoly (2730)
World Championship 35th-KK5 Lyon/New York (4), 17.10.1990

[Comentários do MI Luis Rodi]
1.e4 e5 2.Cf3 Cc6 3.Bb5 a6 4.Ba4 Cf6 5.0–0 Be7 6.Te1 b5 7.Bb3 d6 8.c3 0–0 9.h3 Bb7 10.d4 Te8 11.Cbd2 Bf8 12.a4 h6 13.Bc2 exd4 14.cxd4 Cb4 15.Bb1 c5 16.d5 Cd7 17.Ta3 f5 18.exf5 Cf6 19.Ce4 Bxd5 20.Cxf6+ Dxf6 21.Bd2 Dxb2 22.Bxb4 Bf7 23.Te6 Dxb4 24.Tb3 Dxa4 25.Bc2 Tad8 26.Tbe3 Db4


Uma instância crítica. Em linhas gerais, as brancas devem demonstrar que a sua iniciativa no centro e na ala do rei compensa adequadamente o material empregado -cabe considerar um agravante: as brancas não entregaram meramente material, mas também uma ala completa (!)- Os quatro peões livres das pretas ganham qualquer tipo de final -e aqui temos um detalhe importante: baixo nenhuma circunstância as brancas podem permitir a troca de damas-, o que obriga ao primeiro jogador a manter um grande dinamismo na posição, dando as suas peças a maior atividade possível ao tempo de criar ameaças no setor onde elas têm influencia. A avaliação, pois, é clara, e conduz diretamente ao plano lógico, mas na hora de realizar o lance como seguer?
27.De2 parece uma boa tentativa, fortalecendo o domínio da coluna e criando a ameaça Txe8, porém é refutada com o truque 27...Dc4! (em cambio 27...Bxe6 28.Txe6 Dc4 29.Txe8 Txe8 30.Dxe8 Dxc2 31.De6+ Rh8 32.Df7 acaba em empate após 32...Dc1+ 33.Rh2 Df4+=) 28.Bd3 (a chave da ideia preta é a seguinte continuação, subministrada por Zajcev: 28.Txe8 Dxe2 29.Txf8+ Rxf8 30.Txe2 a5 onde os peões pretos são mais fortes que o cavalo branco) 28...Dc1+ 29.Rh2 c4 onde a vantagem preta não oferece dúvidas, por exemplo 30.Bc2 (30.Txe8 Txe8 31.Txe8 cxd3 32.Txf8+ Rxf8 33.Dxd3 Df4+ 34.Rg1 Rg8–+) 30...Bxe6 31.fxe6 Be7 (31...d5!? 32.Bg6 Bd6+ 33.g3 Te7 34.Bf7+ Rh8 35.Ch4 Db1 36.Cg6+ Rh7 37.Ch4 Txf7 38.exf7 Tf8 39.Df3 Bc5 com clara vantagem preta) 32.Cd4 d5 33.Bg6 -uma a continuação aportada mencionada por Kasparov, que a considera uma tentativa de salvamento, apesar das pretas sempre ter "o xeque Bd6 em reserva"-
Para entender o seguinte lance, nada melhor que dar a palavra ao seu autor: "As brancas têm uma fina posição de ataque, porém nenhuma ameaça direta até agora. Para elas aparecer, esse lado deve de maneira urgente por as suas últimas reservas na batalha -seu cavalo de f3-, e depois forçar a troca ...Bxe6, sem permitir a troca de damas, para explorar o afastamento da dama branca do seu rei. Assim foi como o modesto avanço do peão g foi concevido" (Kasparov)

27.g3!


"Concedendo uma boa casa ao rei e simultaneamente preparando o translado do cavalo à casa h4. 27.g4 era tentadora com a ideia g5, porém evidentemente Kasparov percibiu que o enfraquecimento da casa f4 podia se fazer senter no futuro, e então ele evitou essa continuação" (Geller, Lein). Agora, a escolha preta não é menos difícil. Karpov deve decidir seu lance entre uma série de promissorias continuações, que requerem de adequado cálculo. Elas devem, claro, estar dentro do plano geral de avanço na ala da dama, mas ao mesmo tempo se deve manter um olho na defesa, considerando que as peças brancas estão perigosamente perto da posição do rei preto. Após determinar que nenhúm perigo imediato ameaça ao seu rei, o condutor das pretas entende que é possível seguer com um movimento de peão na ala da dama, criando mais pressão

27...a5!?

"Como as alternativas naturais ...d5 ou ...c4 ajudam às brancas à ativar seu cavalo, Karpov avança o peão a, que no caso de chegar à sexta fileira vai ser uma real diversão" (Kasparov). Algumas alternativas são:
a) 27...c4 foi recomendada por Tal. As brancas têm equilíbrio aqui continuando com 28.De2 Bxe6 29.Txe6 Dc3 30.Txe8 Txe8 31.Dxe8 Dxc2 32.De6+ Rh7 (porém não 32...Rh8 33.Ch4+-) 33.Dg6+ Rg8=;
b) Korchnoi e Christiansen fizeram a sugerencia 27...d5 28.Ce5 (28.Txe8!? é uma possível opção) 28...d4 (28...Bxe6 29.fxe6 Txe6 30.Cd3 Dd4 31.Txe6 c4 com compensação) 29.Tb3 Bxe6 onde a continuação de Kasparov, 30.fxe6 Txe6 31.Txb4 Txe5 32.Tb1 c4 é talvez favorável ao primeiro jogador -se bem que o então campeão mundial indica empate como resultado mais provável na linha 33.Dd2 d3 34.Bd1;
c) 27...Db2!? é uma tentativa (não mencionada nos livros que se ocupam do match até onde conheço) de levar a dama preta à ala do rei (possivelmente à casa f6 após tomar em e6), combinando as ações ofensivas na ala da dama com a defesa do monarca. No meu ponto de vista, este lance pode ser o mais correto nesta posição; linhas como 28.De2!? (28.Tb3 Da2 29.Tbe3 c4 30.Cd4 d5–+) 28...Bxe6 29.fxe6 Df6 30.Dd3 g6 31.Dd5 Be7 32.Ch4 parecem favoráveis às pretas, se bem que são ainda complexas e concedem ao primeiro jogador certa compensação.


Depois de algumas aventuras mais -onde as brancas jogaram todas suas cartas à iniciativa na ala do rei-, o jogo acabou em empate:

28.Ch4 d5 29.De2 Dc4 30.Bd3 Dc1+ 31.Rg2 c4 32.Bc2 Bxe6 33.Txe6 Txe6 34.Dxe6+ Rh8 35.Cg6+ Rh7 36.De2 Dg5 37.f6 Dxf6 38.Cxf8+ Rg8 39.Cg6 Df7 40.Ce7+ Rf8 (as brancas têm xeque perpétuo) ½–½


 

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Mate em três lances

Alfredo de Musset (1810-1857) foi um reconhecido escritor francês, representante da corrente romanticista, e também apaixonado pelo xadrez. Entre outros, compús o seguinte probleminha, um mate em três lances cuja solução publicaremos na proxima quinta feira:

Um antecessor de Petrosian

Um dos mais famosos presidentes dos Estados Unidos de América, Abraham Lincoln (1809-1865) era um frequente jogador de xadrez (seu tabuleiro e peças estão no Smithsonian Museum), incluso quando governava seu país desde a Casa Branca.
Emil Ludwig comenta que "como enxadrista, Lincoln demonstrava a sua prudencia mantendo-se à defensiva até o momento no qual podia atacar com todas as garantias de sucesso"

sábado, 25 de fevereiro de 2012

A importancia da estrutura

A formação de peões é um dos elementos fundamentais na compreensão do moderno xadrez. Peões fracos (dobrados, isolados, afastados da base, demasiado adiantados ou atrasados) apresentam diversos defeitos que um oponente experimentado pode explorar.
Na posição seguinte cada lado conta com duas torres e uma peça menos, além de três peões. As pretas têm torres ativas, e seu bispo pode ser considerado qualitativamente melhor que o cavalo. No entanto, enquanto a formação de peões branca está integrada por uma compacta massa, a das pretas está dividida em tres blocos, cada um deles composto por um peão isolado. A permanente defesa deles distrai as peças do segundo lado, sendo pois a vantagem para o primeiro jogador, que se impús da forma que segue:

Bulski,Krzysztof - Moranda,Wojciech
Polish-ch Warsaw POL (8.4), 25.02.2012



43.Cf6+ Rg7 44.Rg2
Se antecipando à possível atividade das torres adversárias, o rei branco avança em procura de mais segurança
44...Be7 45.Cd5 Tc2+ 46.Rh3 Bc5 47.Tc6 Tbb2 48.Cf6!
A fraqueza dos peões isolados permite às peças brancas criar boas bases de operações no mesmo coração da posição adversária
48...Tc3
48...Bb6 49.Ch5+ Rh7 50.Td6 com a ideia Rg4, e5, é claramente vantajoso para o primeiro jogador
49.Ch5+ Rh7 50.Tc7 Rg8 51.Ta1
Este lance não estraga nada porém ainda melhor era 51.Tc8+ Bf8 52.Td8+-
51...Ta3 52.Tc1 Bf8 53.Tc8 Tc3
53...Tbb3 54.e5 e as brancas têm posição ganhadora; 53...Tb7 54.Cf6+ Rg7 55.e5+-
54.T1xc3 dxc3 55.Txc3
Após o ganho material, a posição do primeiro jogador é ganhadora
55...Tb8 56.Cf6+ Rg7 57.Tc6 Td8 58.Rg4 Ta8 59.e5 Ta7 60.Ce8+ Rg8 61.Cf6+ Rg7 62.Cd5 Ta3 63.Tc7 h5+
Sem esperar a réplica branca, as pretas abandonaram. 64.Rxh5 Txg3 65.e6 é decisiva 1–0

Krzysztof Bulski é a surpresa do campeonato polonês 2012. Quando falta somente uma rodada -a se realizar este domingo- este relativamente desconhecido enxadrista -mestre internacional, 2523 elo e pré-classificado 15 na prova- leva 5 pontos sobre 8 possíveis, compartilhando a quarta colocação.

 

Armada brasileira na França


No que está se convertindo num bom costume, marcante presença de brasileiros em torneios abertos importantes na Europa. Aconteciu em Gibraltar, e agora, desde este domingo, no open de Rochefort, onde participam os grandes mestres Alexandr Fier (foto) e K.Mekhitarian, os mestres internacionais Roberto Molina e Evandro Barbosa e os mestres fide Ivan Kuhlmann Nogueira e Luiz Aurelli Abdala. Tudo de bom para eles nesta aventura gala!

Site oficial: http://www.echiquier-rochefortais.com/index.php



sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Diversidade em Nancy


Há diversidade no xadrez. Os ritmos novos estão se adicionando ao tradicional e até a FIDE tem estabelecido um sistema de rating especial para partidas rápidas e blitz. Por enquanto, em compartimentos separados, porém tem torneios que já misturam os tempos, um experimento que pode não ser o melhor desde o ponto de vista enxadrístico, porém sem dúvida estão planejados para chamar a atenção da mídia.

Dentro dos experimentos mencionados, o torneio de Nancy (França) é um dos mais extravagantes: seis grandes mestres de alto nível, dez rodadas –todos contra todos a dupla volta-. Ontem, 24, acabou a primeira volta com a realização da rodada 5, depois de partidas standard desenvolvidas a razão de uma por dia.
O jogo Bauer - Edouard (empate) pela rodada 2

Até aqui, normal. No entanto, a segunda volta –as partidas revancha- vai acontecer em dois dias, sendo partidas rápidas! Na minha opinião, a mistura de ritmos só pode ser prejudicial para o desenvolvimento do torneio. Os organizadores teriam feito melhor em realizar o torneio a cinco rodadas, declarar um vencedor e depois, se querem, partidas rápidas para encantar a TV e a mídia, pois então mais um torneio, diferente ao primeiro e começando de zero.

Blitz, partida rápida e xadrez pensado são coisas diferentes. Se jogam com as mesmas peças –assim como futebol e golf se jogam com bola- porém são coisas diferentes. Nada contra: todas têm o direito de existir. Porém não de se equiparar. Nestes tempos de realizações rápidas e produtos pré-digeridos, há quem ainda tem vontade de por a funcionar os neurônios e investir vinte minutos em avaliar uma posição e achar um bom plano.Não é televisivo? Pena. Porém é xadrez. Os outros ritmos são brincadeira, algo que todos fazemos com as mesmas peças quando não estamos jogando xadrez e temos cinco, três ou um minuto para exercitar a velocidade das nossas mãos. É divertido, mas não é xadrez.

No torneio de Nancy, ao finalizar as primeiras cinco rodadas as posições são: 1-3. Ivan Sokolov, Christian Bauer e Roman Edouard 3 pontos; 4-5. Alberto David, Chanda Sandipan 2,5; 6. Yuri Solodovnichenko 1
Aqui, um dos interessantes jogos disputados nessa cidade francesa:
Sandipan,Chanda (2628) - Sokolov,Ivan (2649)
Festival Conseil Général - Nancy (2), 21.02.2012
[Comentários do MI Luis Rodi]
1.d4 Cf6 2.c4 e6 3.Cc3 d5 4.cxd5 exd5 5.Bg5 c6 6.e3
Alguns autores -McDonald, por exemplo- consideram que a ordem mais correta é 6.Dc2 privando às pretas da seguinte possibilidade

6...Bf5
O bispo desenvolve de forma ativa pela sua melhor diagonal. No entanto, outra parte da teoría -por exemplo no livro de Rizzitano- considera que a linha seguinte favorece as brancas -em consequência, a ordem empregada por esse lado não é tão importante-. As pretas, claro, podem sempre escolher a linha principal mediante 6...Be7 7.Bd3 Cbd7 8.Dc2 0–0

7.Df3 Bg6 8.Bxf6 Dxf6 9.Dxf6 gxf6
Uma posição importante desde o ponto de vista teórico que, como se percebe nos comentários prévios admite diferentes leituras dos autores que a consideraram -e também dos mestres-. As brancas entregaram o par de bispos, deteriorando a estrutura preta na ala do rei em compensação. Nos seus futuros planos o controle da casa f5 tem um lugar privilegiado, já que a ocupação desse ponto com uma peça menor que não pode ser desalojada é um logro posicional

10.Cge2

10.h4 10.Cf3 e 10.Rd2 são opções importantes aqui. A escolha do grande mestre indiano é polifuncional: o cavalo rei branco dispõe de dois possibilidades no futuro, em g3 (para lutar pelo controle de f5) ou f4

10...a5!?

Uma ideia pouco usual. A mais utilizada é 10...Bd6 onde 11.g3 Cd7 12.Cf4 foi empregada com antecedência pelo condutor das brancas; após 12...Re7 13.0–0–0 Cf8 14.Cxg6+ hxg6 15.e4 dxe4 16.Cxe4 Td8 17.Bc4 Ce6 a posição é aproximadamente igual, Sandipan - Ulanov, São Petersburgo 2009

11.Tc1

A novidade do jogo. Com antecedência tinha-se empregado 11.Rd2 onde 11...Cd7 12.Cg3 a4 13.f4 h6 14.f5 Bh7 oferece chances aos dois lados, Saidy - Martinovsky, Honolulu 1997. O bispo de casas brancas do segundo lado está confinado em uma engraçada situação, mas a estrutura branca não é a melhor; A inédita 11.h4!? é outra possibilidade

11...Cd7 12.h4 h5 13.Cf4 Bd6 14.g3 a4 15.a3 Cb6 16.Rd2 Rf8

O rei pode se dirigir á casa g7, para facilitar a comunicação entre as torres. A posição é aproximadamente equilibrada, mantendo as suas principais caraterísticas: o par de bispos das pretas compensando a deficiencia estrutural desse lado

17.Cxg6+

Esta decisão recompone os elementos de cada lado: as pretas perdem o seu par de bispos porém consertam a sua formação de peões na ala do rei. No entanto, as brancas podiam seguer sem esta troca, por exemplo com 17.Be2 que parece mais empreeendedora

17...fxg6 18.Bd3 f5
Agora a posição é totalmente equilibrada, com bispos de cor diferente na equação. Cada lado, de acordo as regras de Steinitz, vai tentar volcar ao seu favor o equlíbrio, fazendo uso dos seus elementos fortes

19.Ce2 Th7 20.Tc3 Cd7 21.Cf4 Bxf4 22.gxf4

Uma nova transformação: as pretas entregaram seu bispo, a cambio do qual dobraram os peões brancos -certo, o primeiro lado ganha uma coluna aberta-. Tendo em conta o caráter fechado da posição, as peças menores que permanecem no tabuleiro são de valor similar

22...Te7 23.Ta1 A ideia que envolve este lance (o avanço do peão b) não é a mais correta. Na teoria, a abertura da posição pode favorecer ao bispo na luta de peças menores, pelo seu maior alcance, porém há outros elementos que devem ser considerados, como a fraqueza do peão a ou as chances pretas, incluso em uma posição mais aberta, de obter uma boa casa para o cavalo

23...Cf6 24.Tb1 Ce8 25.b4 axb3 26.Tbxb3 Cd6

Aqui está o resultado das operações brancas: a melhor estrutura faz preferíveis as chances do segundo lado

27.Tb4 Tee8 28.a4 Ta7 29.Bc2 Re7 30.Tb1 Rd7 31.Tg1 Te6 32.Tb3 Rc7 33.Tbb1 Ta5 34.Tg2 c5 35.dxc5

35.Rc3 c4 é algo melhor para as pretas

35...Txc5 36.Bd3

Uma possível opção é 36.Tgg1 Cc4+ 37.Rd3 Ca3 38.Tb2 Tec6 39.Bb3 Tb6 A posição das pretas é preferível

36...Ce4+ 37.Bxe4 dxe4

A vantagem de espaço, a melhor estrutura e as torres mais ativas concedem às pretas a preferência neste final. No entanto, as brancas podem opor uma séria resistência contrajogando sobre os peões fracos do segundo lado (b7 e g6)

38.Tgg1?

Porém não assim. Era necessária 38.Tb2! para cuidar a segunda fileira, e no caso de 38...Ta5 39.Tc2+ Rb6 40.Tc4 com boas chances de defesa. Certo, as pretas ainda podem manter a iniciativa continuando com 40...Td5+ 41.Re2 Ted6 42.Tc2 Td3 porém converter esta posição em ponto teria requerido de certa técnica

38...Td6+ 39.Re2

A opção 39.Re1 Tc2 40.Ta1 Ta6 é claramente favorável às pretas, que ameaçam ...Txa4. Se 41.Tb1 Ta2 42.Rf1 T2xa4 com clara vantagem

39...Tc2+ 40.Rf1 Ta2
Na seguinte fase o jogo apresenta algumas imprecisões, talvez produto de apuro de tempo, porém apesar disso o caráter da luta não muda: as pretas sempre têm uma importante vantagem fruto dos elementos mencionados no comentário ao lance 37. E fundamentalmente, a posição branca na prática é muito difícil de jogar

41.Tb4

41.Tc1+ Rd7 42.Tb1 b6 com clara vantagem

41...Ta6!?

41...Tdd2!?

42.Tc4+ Rb8 43.Tg3

43.Tb4 Ta1+ 44.Rg2 T6xa4 45.Txa1 Txb4 com clara vantagem

43...Tb6 44.Tg1 Tbb2–+ 45.Txg6

45.Rg2 Txf2+ 46.Rh3 Ta3 47.Txg6 Txe3+ 48.Tg3 Tee2 ganhando

45...Tb1+ 46.Rg2 Taa1
A rede de mate somente pode ser desbaratada mediante entrega de material inaceptável para o primeiro lado 0–1

(Jogo originalmente publicado no jornal XADREZ DIÁRIO)